Estande de tiro de uma escola de formação de vigilantes em São Paulo. Com um décimo da carga horária de um PM, metade dos alunos sai com emprego.
Há sete meses, uma mulher foi vítima de sequestro-relâmpago quando estacionava o carro na rua de trás de um condomínio de alto padrão no bairro do Ipiranga, Zona Sul de São Paulo. O episódio motivou o síndico do prédio, o executivo Danilo Rocha, de 39 anos, a instalar um sistema de iluminação nas ruas ao redor. Antes, os 200 condôminos já haviam decidido gastar R$ 30 mil por mês na contratação de uma empresa que garantisse a segurança. Todos se beneficiaram com a situação: os moradores, quem para o carro nas ruas e até lojistas vizinhos.
No mundo ideal, nem os moradores do Ipiranga nem os da Casa Verde, ou de qualquer outro bairro do Brasil, deveriam gastar dinheiro com vigilantes particulares. A Constituição de 1988 obriga os Estados e a União a zelar pela segurança pública, que inclui a ordem pública, a integridade física das pessoas e proteção de seu patrimônio. Na prática, o governo divide essa tarefa com empresas privadas. Infelizmente, nos acostumamos a pagar pelo que não deveria ser pago, diz o síndico Danilo Rocha.
No Brasil, os serviços de segurança privada movimentaram R$ 15 bilhões em 2009. Para ter uma idéia, nos Estados Unidos os gastos com segurança privada foram de US$ 48 bilhões no ano passado. Proporcionalmente, nós gastamos quase o dobro (0,55% do PIB, ante 0,32% lá). Entre os americanos, só milionários e empresas apelam para esse serviço.
Segundo a Polícia Federal, há no país 1.491 empresas legais que empregam quase 500 mil vigilantes. É um número similar ao da soma de policiais civis e militares, segundo estimativas de autoridades de segurança. O setor cresce 15% ao ano. Em alguns casos, até mais. Selma Migliori, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Sistemas Eletrônicos de Vigilância, diz que seu segmento (equipamentos como câmeras de monitoramento) cresce a uma taxa de 13% e atinge 650 mil imóveis no país.
Essa procura pode ser reflexo do crescimento da economia do país. Mas reflete a omissão do Estado. Apesar da montanha de impostos que os brasileiros pagam, o contribuinte não conta com garantias que deveriam ser dadas pelo poder público. A exemplo do que ocorre na educação, na saúde e na previdência, a segurança também se tornou uma despesa a mais no orçamento das famílias. E nem é preciso ser rico, nas comunidades pobres, as milícias cobram dos moradores para, supostamente, protegê-los dos bandidos.
A Polícia Federal, que controla as empresas de segurança privada, diz que a cada ano 240 novas empresas de segurança pedem registro. Desse total, apenas 5% correspondem a empreendimentos de médio ou grande porte. A grande maioria é de empresas de atuação regional, com poucos funcionários.
Está na Constituição: o poder público também é responsável por cuidar de seu patrimônio particular.
Para Luís Roberto Barroso, professor de Direito Constitucional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, é admissível gastar dinheiro além dos impostos num plano de saúde ou na escola dos filhos. Mas no caso da segurança, a situação é mais grave. Segurança em condomínios é um fenômeno brasileiro provocado pela ineficiência do serviço público, diz. Evidencia a dimensão patológica de deficiência do Estado na prestação de um serviço essencial.
Ao responder à pergunta de onde vem a sensação de insegurança do brasileiro? O secretário Nacional de Segurança Pública, Ricardo Balestreri, diz: O Brasil não é um país seguro.
Fontes: Revista Época, Rais e SSP-SP DPF/Sisvip; Órgãos Estaduais de Segurança Pública Senasp/MJ e IBGE (2010)